Poucos fabricantes se atrevem a lançar e propagandear produtos explicitamente feitos para pessoas com mais de 60 anos. O risco de rejeição é enorme, porque ninguém gosta de ser identificado como idoso.
Mas a Natura vai arriscar e lançar em agosto uma linha de cosméticos específicos para homens e mulheres com mais de 60 anos, que são 19 milhões no país.
Outras marcas, como a L’Oreal, preferem ser discretas e usam a palavra “mature” no rótulo desse tipo de produto. A Natura decidiu ser explícita e chamará a linha de “VôVó”.
Há alguns anos, dizer que um produto tinha foco na classe C era rotulá-lo como “coisa de pobre” – algo fora de cogitação para boa parte das empresas. Muitas companhias acreditavam que ter um quê de popular era estigmatizar um produto e condená-lo ao fracasso.
Hoje, a história é outra: nada mais em voga que a antes rejeitada classe C. O alvo da rejeição agora é o consumidor com mais de 60 anos. Embora essa faixa etária seja uma das mais promissoras em termos de consumo, poucos fabricantes se atrevem a lançar produtos declaradamente para esse público.
A Natura é um deles. A fabricante de cosméticos lança em agosto uma linha chamada VôVó, direcionada a homens e mulheres com mais de 55 anos.
“Não queremos que o mercado interprete que a Natura quer aproveitar uma oportunidade. O objetivo dessa linha é fazer uma reverência às pessoas mais velhas, uma valorização que se perdeu nessa nossa sociedade que privilegia o presente e o jovem”, diz Denise Figueiredo, diretora de unidade de negócios da Natura, de 45 anos.
O momento é propício, como admite a executiva. “Hoje, 19 milhões de pessoas no Brasil, segundo o IBGE, têm mais de 60 anos e essa é a faixa etária que cresce em ritmo mais acelerado”, diz ela, citando dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Na América Latina – e a Natura estuda levar a marca para outros países em que atua – estima-se que a população com mais de 50 anos represente 19% do total, segundo dados da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal). As estimativas são de que em 2025, essa parcela chegue a 26% e a 38% em 2050.
No Brasil, 29% dos lares têm donas de casa com mais de 50 anos, segundo o levantamento mais recente da Nielsen sobre o assunto, feito em 2009. Esses lares não têm crianças e seu consumo é 15% superior à média das faixas etárias.
Mesmo com os números a favor, é difícil encontrar produtos focados nesse público. A fabricante de calçados Piccadilly, por exemplo, tinha uma linha de calçados para senhoras – com a forma feita para um pé mais largo ou inchado. Mas tirou os calçados do mercado, depois de uma reformulação para rejuvenescer sua marca.
Em geral, produtos com esse público-alvo vêm com a palavra “mature” estampada no rótulo, que significa maduro em inglês. É o caso do creme da L’Oréal, da linha Skin Expertise Age Perfect, ou da Hypermarcas, que tem o sabonete líquido íntimo Lucretin Mature.
A Natura quis ser mais clara e preferiu um nome simples e em português. “Não queremos estereotipar os avós. Hoje eles não têm nada de ‘Dona Benta’.
São muito mais descolados”, diz Denise. Ela conta que a linha é formada por duas colônias (feminina e masculina, um hidratante, sabonete líquido para o rosto, creme de massagem para mãos e braços e um álbum, com preços entre R$ 20 e R$ 79.
“Os principais produtos da linha são o creme de massagem e o álbum, por que a ideia é que os netos massageiem os avós e que os dois preencham o álbum com fotos e histórias, promovendo o elo entre as duas gerações.”
A linha, diz ela, foi basicamente desenvolvida para ser um presente comprado pelos pais para os filhos (a maior parte de sete a 12 anos) entregarem a seus avós. Essa seria a maneira de atingir o consumidor-alvo, driblando o estigma de que pessoas de idade repelem produtos focados em consumidores maduros.
“Mas isso também não quer dizer que um avô ou avó não possam comprar os produtos para uso próprio”, diz Denise. Para isso, ela conta com o treinamento às vendedoras da marca. “Como nossa venda é direta, é bem mais fácil lançar uma linha como essa, porque a consultora pode explicar todo o conceito para o consumidor, o que não aconteceria com um produto em uma prateleira”, explica ela.
Para desenvolver a linha, a Natura levou três anos e fez pesquisas com 182 avôs e avós. Antes do lançamento, repetiu as pesquisas com oito grupos de avós e netos por um ano e meio.
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